22 de agosto de 2017

Jacarezinho não tem culpa

Já são seis dias com presença maciça das polícias no Jacarezinho. O saldo desta operação são algumas drogas apreendidas, uns presos (virão outros no lugar) e mortes de todos os lados: uma delas de um pai de família que vendia frutas e verduras na própria favela para sobreviver.
Eu estava no trabalho e, apesar de não conhecer o senhor, fui às lágrimas quando soube da notícia e vi, sem querer, a foto da cena que ninguém deseja ver. A dor no coração por mais uma vida indo embora e pelo sentimento de impotência a curto prazo.
Não costumo usar o termo "inocente" para me referir aos lados desta guerra, porque somos todos inocentes em meio a um Estado assassino. A única coisa que nos fornecem como serviço é uma política anti-drogas comprovadamente ultrapassada.
Isso já foi alvo de estudo até das Organizações dos Estados Americanos (OEA), que muito ajudou o ex-presidente José Mujica a implantar a regulamentação da maconha no Uruguai, que tem dado certo com a diminuição de mortes relacionadas ao tráfico.
Invasões nas favelas com discurso para combater o narcotráfico existem há décadas: a população sangra, literalmente, e paga com a própria vida. Projeto de "segurança" (assassina) nas periferias não falta. Estes locais são desfalcados pelo bem mais precioso de todos: a educação, um dos únicos caminhos capaz de mudar o panorama de descalabro.
Não é preciso dizer que basta! Como as centenas de pessoas do Jacarezinho que foram pedir "Chega!" na Avenida Dom Helder Câmara nesta terça-feira (15), numa tentativa de parar com a própria voz as balas e os caveirões que atravessam a favela.
Clichê, mas este povo é guerreiro pra caralho! Embora aprisione, o Estado não derruba facilmente o meu povo, que não se abate. Trabalhamos, estudamos, sonhamos... somos iguais a qualquer um do asfalto. A única diferença é que precisamos fazer 100 vezes mais para alcançar o objetivo.
Isso nos deixa calejados, faz-nos criar casca e nos dá uma visão de vida longe de nossos umbigos. O Jacarezinho e qualquer outra favela não são culpados por esta situação descontrolada.
Não tenho o desejo de sair daqui, mas sou forçado a querer por causa de Garotinho, Rosinha, Cabral, Pezão, PMDB, que fazem mais do mesmo. Crivella, que prometeu cuidar das pessoas, permanece calado e conivente.
Jacarezinho não é só tiro, não é só bala. Um exemplo é o Toque de Bola e suas crianças, que vocês podem ver em algumas fotos abaixo. Olhem por nós! Somos alegria, somos sonhos, somos vida! Por fim, deixo o refrão da música "Quem me leva os meus fantasmas", de Pedro Abrunhosa e famosa na voz de Maria Bethânia.
"Quem me leva os meus fantasmas
Quem me salva desta espada
Quem me diz onde é a estrada
Quem me leva os meus fantasmas
Quem me leva os meus fantasmas
Quem me salva desta espada
E me diz onde é a estrada"
Fotos: Fábio Caffé, Fabiano Gigante e Paulo Barros.








Ode ao ídolo

Ídolo Berola

Quando criança, começamos a nos moldar e ter os nossos gostos. No Jacarezinho, cresci em meio à pulsação do futebol de várzea. Pra quem gosta, um lugar prato cheio pra disputar um bom campeonato, seja no gramado sintético do Campo do Abóbora ou no rala coco do Campo da GE.

Na infância, comecei a ser levado pelo meu tio Marcio Bello pra assistir aos jogos do Azul no Campo da GE, lá na década de 90. Era o time homônimo da nossa localidade, a parte mais alta.

Ali, comecei a ter as primeiras referências do futebol. Em jogos do Azul, fundado em 1974, via um cara brilhar debaixo das traves. Gordinho e fora dos padrões do futebol de várzea de alto nível.

Ser acima do peso nunca foi problema para Berola, o camisa 1 do Azul. Então, passei a ir pro campo pra torcer pro Azul e também pra ver o Berola agarrar. Mais tarde, viria saber porque me encantava tanto por aquele cara doido que se jogava no chão de terra batida. Acabei virando jogador do gol.

Berola foi minha primeira referência, e só positiva, pra posição mais ingrata do futebol. Assistindo aos jogos do Azul lá pelos sete/oitos anos, eu só pensava em jogar no time de maior tradição do Jacaré e ser igual ao Berola: imponente debaixo das traves, respeitado pelos adversários e querido nas resenhas regadas à cerveja pós-jogo.

Não sei se tive sucesso nessa parte, mas eu só pensava em ser igual a ele. Só sei que tive o privilégio de vê-lo jogar, assim como vi Messi, Neuer e cia. in loco na final da Copa de 2014.

Hoje, ouvir dele "você é pica" vale mais do que o que eu poderia ser caso fosse profissional. Até jogo contra ele. Sou completo. Questão de representatividade.

Berola, o meu primeiro ídolo no futebol. Todos sabem da minha admiração por ele. Histórias nossas histórias: assim que nos alimentamos. Qual o seu primeiro ídolo?

Vida longa ao Berola!